Pages

terça-feira, 10 de abril de 2012

Fobia social e Timidez


Fragmentos de alguns casos


1º caso: O telefone toca e do outro lado uma voz esmorecida sem rodeios perguntava o valor da sessão. Por um momento achei que estava falando com uma criança de uns 10 anos, quando me surpreendo em saber que se tratava de um rapaz de 22 anos.


2º caso: Aos 2 anos quando alguma visita chegava em casa, ele tratava de se esconder por entre as pernas de seus pais, parava de falar e quando todos estavam distraídos, sorrateiramente dirigia-se para um cômodo da casa onde pudesse ficar sozinho. Aos 16 apaixona-se por uma menina e quando os seus olhares se cruzam, imediatamente fica ruborizado . Não pode mais esconder-se nas pernas de seus pais, como forma de buscar confiança. Agora sente-se inseguro, com dificuldades para conversar com as pessoas e temeroso com tudo.


3º caso: "Os primeiros sintomas de ansiedade excessiva surgiram por volta dos 15 anos. Na escola, tinha taquicardia e tremores antes de apresentar trabalhos na frente dos colegas e isso afetou meu desempenho.

4º caso: “Nas rodas de amigos, eu ficava calada e, se alguém me dirigia uma pergunta, ficava vermelha de vergonha. Tinha medo de ser criticada se precisasse concordar ou discordar com a opinião de alguém. Temia também dizer não às pessoas, achando que seria desagradável”.


5º caso: A sua queixa inicial ao procurar a terapia era de consumismo exacerbado. De imediato, foi constatado que se tratava de mais um caso de fobia social, no qual o paciente comprava compulsivamente porque não conseguia dizer "NÂO" aos vendedores.


6º Caso: “ Gastava muito dinheiro com taxis no transporte de minha mãe cadeirante, por isso resolvi comprar um carro. Gastei toda a minha poupança nesse investimento, para ele não sair da garagem por mais de 1 ano. Perdi minha poupança, minha dignidade e ainda continuava gastando dinheiro com taxi.”

7º caso: Até os 6 anos de idade, passava longos períodos sozinha em seu quarto desenhando e assistindo televisão. Sua mãe incentivava esse comportamento ainda mais depois do nascimento do segundo filho. Quando a menina pedia para levar alguma amiguinha para casa, a mãe não deixava. Seu primeiro sintoma de fobia social apareceu nos relacionamentos. Chegou aos 40 anos virgem e solteira. Não consegue estabelecer laços de amizade reais. Somente alguns pela internet. Não consegue se estabelecer em emprego nenhum. 



Pensemos em uma pessoa que precisa fazer uma apresentação oral. A situação em si desencadeia uma ansiedade  e alguns sintomas como: bolo na garganta, rubor ou palidez, garganta seca, vontade de fugir...

Essa pessoa acima é tímida ou sofre de fobia social?

Como então diferenciar timidez de fobia social?


Falar de timidez e fobia social significa falar de ansiedade. Denominado transtorno de ansiedade social, a fobia social se caracteriza por uma ansiedade excessiva sentida quando se é observado,desencadeando uma serie de sintomas.
De acordo com o  DSM-IV, a fobia social (Distúrbio de Ansiedade Social) é caracterizada por um medo acentuado e persistente de uma ou mais situações sociais ou de desempenho. A pessoa teme agir de um modo ou mostrar sintomas de ansiedade que lhe sejam humilhantes e embaraçosos, sendo que a exposição à situação social temida provoca uma resposta de ansiedade intensa que pode chegar a um ataque de pânico. A pessoa geralmente evita essas situações ou as suporta com intenso sofrimento. A fobia social apresenta significativa interferência nas rotinas de trabalho, acadêmicas e sociais e/ou sofrimento acentuado.

Como podemos entender a fobia social?
Ela pode ser dividida em dois tipos
Generalizada:
o portador tem medo de quase todo o tipo de contato social, como assinar o nome em documentos, ir a festas e participar de reuniões. É o tímido patológico.
Circunscrita: o paciente pode ser extrovertido em certos casos, mas teme situações sociais específicas, como falar em público ou comer perto de estranhos —nesse último caso, é comum apelar primeiro ao álcool, para vencer a timidez, e só depois começar a refeição.

Uma pessoa tímida pode vir a ser um fóbico social?
Existe uma linha muito tênue que separa um do outro.Tudo dependerá da intensidade da ansiedade. Quando essa timidez compromete a vida da pessoa, seja para começar a namorar, escrever diante de uma pessoa, telefonar, trabalhar, ai sim podemos pensar que se esta caminhando para uma fobia social. A essência da fobia é o medo de ser avaliado pelos outros.

Se é assim, em algum momento da vida, todos nós já não fomos um fóbico social?
Porque se pensarmos em algum momento da vida, todos nós ficamos com medo de falar em publico e nos acharem ridículos. Sim,a ansiedade faz parte do ser humano Toda a situação tem um grau de ansiedade.Entretanto, o agravante é se essa ansiedade faz com que a pessoa comece a evitar a situação. É justamente essa ansiedade tamanha que o diferencia do tímido. Existem determinados compromissos que são inevitáveis, como o ato cívico de votar. "Há casos de fóbicos que não vão votar por terem que assinar o nome na frente do mesário", conta Antonio Egidio Nardi¹.

Essa evitação nem sempre é consciente. Daí surgem os problemas de autossabotagem.

Medo de dirigir pode ser uma fobia social?
Se você não dirige porque tem medo do que as pessoas vão pensar ou falar a seu respeito caso o carro venha a  morrer,caso você não consiga estacionar, ai sim pode ser uma fobia social.(6ºcaso)

Existe uma faixa etária para se manifestar?
É bom que os pais observem seus filhos. As crianças muito choronas,medrosas e receosas  com o contato social merecem atenção especial.
É importante que os pais incentivem o contato social, mesmo que em um primeiro momento haja uma resistencia. O fato é que essa patologia evolui para a vida adulta, tornando-se crônica e comprometendo a vida dessa pessoa.(7º caso )

A pessoa que tem fobia social necessariamente foi uma criança tímida?
Pesquisa mostram que normalmente foram crianças mais retraídas, com uma auto imagem negativa e que desenvolveram baixa autoestima, evoluindo para a construção de um adulto com  alguns sintomas bem característicos: São pessoas que tendem a nunca quererem desagradar ninguém, que são muito submissas com grande  dificuldade em falar “não”.( 1º 2º 4º 5º casos)


Falar que uma criança é retraída ou quieta é o mesmo que dizer que ela é tímida?
A sociedade valoriza e incentiva uma criança com comportamento quieto, que não dê trabalho aos adultos, mas é importante olhar para o quanto “quietinho é essa criança” Uma criança assim pode estar desenvolvendo um comportamento patológico de necessidade de agradar as outras pessoas com a fantasia de que desta forma será mais amada  e ou avaliado positivamente. O fóbico social tem um medo muito grande de ser avaliado negativamente por ser muito sensível a critica.
Vale destacar que  para diagnosticar fobia social em crianças é fundamental observar se a ansiedade ocorre com grupo de iguais, e não somente na interação com adultos. Isto por que muitas crianças uma vez ou outra são tímidas e inibidas em frente de adultos. (2º caso)

Em uma situação de exposição, como se comporta um fóbico?
Um funcionário apresenta um projeto para seu chefe e esse faz suas ponderações, positivas e negativas. O fóbico social, fica remoendo os aspectos negativos , se achando estúpido , culpado e esquece dos aspectos positivos. Ele só consegue pensar nos aspectos negativos, aumentando ainda mais o seu sentimento de culpa.
Mas o pior problema decorrente da fobia social é a ansiedade antecipada. A pessoa começa a sofrer a partir do momento em que recebe a notícia de um compromisso do qual não poderá escapar. Não adianta treinar ou se preparar para o evento, a ansiedade não passa. Pior: tende a aumentar à medida em que o compromisso se aproxima. O fóbico social sofre sempre "antes e durante", às vezes por longos períodos.

De acordo com o progresso do tratamento a pessoa vai conseguindo retomar a sua vida social?
Antonio Egidio Nardi¹, também aponta que Era de se esperar que, com o tratamento, o fóbico social ampliasse seus relacionamentos sociais, mas o fóbico acaba reduzindo seu círculo de amizades à medida em que vai se sentindo melhor.
Isso acontece porque o fóbico vive por vezes cercado de oportunistas e "chatos" que se aproveitam do fato de ele não ser capaz de dizer um simples "não" — esse tipo de pessoa aproveita a fraqueza do outro para pedir favores ou dinheiro emprestado, por exemplo. O fóbico não consegue nem dizer não a um vendedor, o que faz com que seja confundido com um comprador compulsivo, quando, na verdade, o problema é o medo de impor sua vontade.( 5º caso)
Com a recuperação da auto-estima depois do tratamento, o fóbico social passa a rever esse tipo de amizade, afastando-se do oportunistas. "Muitas vezes, depois do tratamento, o fóbico chega a abandonar o companheiro com quem vive há anos", acrescenta Nardi¹.

TABELA 1
Diferenças entre fobia social e timidez.
VARIÁVEIS
FOBIA SOCIAL
TIMIDEZ
AUTORES
Inicio
Adolescência
1-2 anos
Turner et al., 1990
Curso
Crônico
Transitório
Zimbardo et al., 1975
Amies et al., 1983
Brunch et al., 1986
Tuner y Beidel, 1989
Turner et al., 1990
Nível de incapacidade social
Alto
Moderado
Turner et al., 1990
Cervera et al., 1998
Interferência nas atividades diárias
Alto
Baixo
López-Ibor y Gutiérrez, 1997
Situações temidas
Limitadas e não limitadas
Não limitadas
D.S.M..- IV, 1994
Condutas de evitação
Frequentes e  graves
Pouco frequenntes
Turner et al., 1990

TABELA 2
Semelhanças entre fobia social e timidez
VARIÁVEIS
AUTORES
Baixa qualidade de vida
Bech y Angst, 1996
Sintomas de ansiedade somática: rubor, tensião muscular, palpitações, tremores e sudorese
Turner et al, 1990
Bech y Angst, 1996
Síntomas de ansiedade cognitiva: medo de avaliações negativas  que possam ser feitas sobre si e receio dos contatos social
Turner et al., 1990


Bibliografia:  
 ASPECTOS COGNITIVOS, EMOCIONALES, GENÉTICOS Y DIFERENCIALES DE LA TIMIDEZ
Autores: Cano Vindel, A.; Pellejero, M.; Ferrer, M. A.; Iruarrizaga, I. y Zuazo, A.
Universidad Complutense de Madrid (Spain)

DSM IV Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (American Psychiatric Association, 2002)


Organização Mundial da Saúde (OMS). CID-10 ¾ Classificação Internacional de Doenças, décima versão. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 1992.  

Citação
 
1-Psiquiatra Pesquisador e professor titular da UFRJ em  Entrevista a Marie Claire- 2002.Acesso em Abril de 2012. http://revistamarieclaire.globo.com/